LIÇÃO 10 – A ATUAÇAO SOCIAL DA IGREJA


3º Trim 2011 - Lição 10: A Atuação Social da Igreja

                                           Como agência do Reino de Deus, a Igreja necessariamente tem de fazer ação social
INTRODUÇÃO
A “missão integral da Igreja” abrange a demonstração do amor ao próximo, que se dá mediante a ação social.
- Não pode a Igreja, como agência do Reino de Deus, deixar de mostrar a mesma compaixão que tem a sua cabeça, Jesus Cristo, mostrando o amor do seu Salvador por obras e não apenas por palavras.
I – A IGREJA LOCAL É UM GRUPO SOCIAL QUE DEVE ATUAR NA SOCIEDADE
- A igreja, embora seja uma agência do Reino de Deus, possui uma dimensão local, já que se encontra no mundo e, como tal, é, um grupo social. “…Em Sociologia, um grupo é um sistema de relações sociais, de interações recorrentes entre pessoas. Também pode ser definido como uma coleção de várias pessoas que compartilham certas características, interajam uns com os outros, aceitem direitos e obrigações como sócios do grupo e compartilhem uma identidade comum — para haver um grupo social, é preciso que os indivíduos se percebam de alguma forma afiliados ao grupo.…”(Wikipedia. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Grupo_(Sociologia) Acesso em 20 dez. 2006).
A igreja local reúne todas as características para ser considerada um grupo social, ainda que, ultimamente, tenhamos de reconhecer que muitas delas, máxime nas grandes cidades e metrópoles deste mundo, andam perdendo a sua identidade comum, como já visto na lição anterior, cada vez mais se parecendo uma “multidão” do que um verdadeiro grupo social, assunto, porém, que não é o que deveremos tratar nesta lição.
- Além de ser um grupo social, a igreja local foi feita por Deus para ser um grupo social que vive em meio aos demais, que não pode deles se separar, como, aliás, tivemos ocasião de estudar neste trimestre. Como “astros no meio de uma geração corrompida e perversa” (Fp.2:15), como “luz do mundo” (Mt.5:14) e como “sal da terra” (Mt.5:13), a igreja local não pode, mesmo, se apartar do convívio com os demais homens, tanto que Jesus, mesmo, disse ao Pai que não pedia que os Seus discípulos fossem tirados do mundo, mas, sim, libertos do mal (Jo.17:15).
- Ora, se a igreja local é um grupo social que deve ser mantido, por vontade de Cristo, a cabeça da Igreja (Ef.1:22; 5:23), entre os demais homens, é evidente que deve, enquanto tal, exercer uma “missão social”, ou seja, deve, enquanto grupo, exercer um papel relevante no relacionamento com as demais pessoas da sociedade onde se encontra.
- Deus não faz coisa alguma sem propósito e, portanto, o fato de a igreja ser um grupo social e de ter de travar relações com as demais pessoas e os demais grupos existentes na sociedade não seria uma coincidência, nem tampouco o resultado de uma vontade ou de uma habilidade desta ou daquela igreja local, mas uma necessidade imperiosa, um dever que se impõe a todos os que se constituem em membros em particular do corpo de Cristo (I Co.12:27).
- Esta dimensão social da igreja tem sido negligenciada ao longo dos séculos e, com muito maior vigor, a partir da Reforma Protestante, movimento que, apesar de ter sido o grande responsável pela manutenção e crescimento da pureza doutrinária, com sua ênfase no caráter individual da salvação e na justificação pela fé, ao mesmo tempo em que se procurava contrapor aos excessos advindos do romanismo com relação à prática de boas obras, acabou gerando um certo menosprezo ao que se convencionou chamar de “ação social da Igreja”, que é o conjunto de atividades que buscam trazer às pessoas as condições mínimas para a sua sobrevivência e dignidade na sociedade.
- Esta triste realidade foi denunciada no Congresso Internacional de Evangelização Mundial realizado na cidade suíça de Lausanne, em 1974, como se vê no item 5 do documento surgido dessa importante reunião, o chamado “Pacto de Lausanne” que ora transcrevemos em sua segunda parte: “…Aqui também nos arrependemos de nossa negligência e de termos algumas vezes considerado a evangelização e a atividade social mutuamente exclusivas. Embora a reconciliação com o homem não seja reconciliação com Deus, nem a ação social evangelização, nem a libertação política salvação, afirmamos que a evangelização e o envolvimento sócio-político são ambos parte do nosso dever cristão. Pois ambos são necessárias expressões de nossas doutrinas acerca de Deus e do homem, de nosso amor por nosso próximo e de nossa obediência a Jesus Cristo. A mensagem da salvação implica também uma mensagem de juízo sobre toda forma de alienação, de opressão e de discriminação, e não devemos ter medo de denunciar o mal e a injustiça onde quer que existam. Quando as pessoas recebem Cristo, nascem de novo em seu reino e devem procurar não só evidenciar mas também divulgar a retidão do reino em meio a um mundo injusto. A salvação que alegamos possuir deve estar nos transformando na totalidade de nossas responsabilidades pessoais e sociais. A fé sem obras é morta.”
- O grande pastor e teólogo anglicano inglês John Robert Walmsley Stott (1921-2011), um dos principais nomes do Congresso de Lausanne, assim se expressou sobre o tema: “…Nossa negligência evangélica do interesse social até os anos recentes, e todo o argumento sobre o evangelismo e a ação social tem sido tanto inadequada como desnecessária. Certamente os cristãos evangélicos têm totalmente o direito de rejeitar o assim chamado 'evangelho social' (que substitui as boas novas da salvação com uma mensagem de aperfeiçoamento social), mas é incrível que nós jamais deveríamos ter colocado a obra evangelística e social uma contra a outra como alternativas. Ambas deveriam ser expressões autênticas de amor ao próximo. Pois quem é o meu próximo, para que eu o ame? Ele não é uma alma sem corpo, nem um corpo sem alma, nem um indivíduo privado divorciado do envolvimento social. Deus fez o homem um ser físico, espiritual e social. Meu próximo é um corpo e alma em comunidade. Eu não posso reivindicar amar meu próximo se estou realmente preocupado com apenas um aspecto dele, seja sua alma ou seu corpo, ou sua comunidade.…” (extraído de Ande Sob os Seus Pés - London: IVP, 1975 - p. 16 apud Evangelismo e Ação Social. Trad. de Felipe Sabino de Araújo Neto. Disponível em: http://www.monergismo.com/textos/evangelismo/stott_evangelismo_acao.htm Acesso em 14 jul. 2011).
- No entanto, quando verificamos que Deus criou o homem como um ser social (Gn.2:18), bem como que o pecado, embora cometido individualmente, traz severas consequências para a vida em sociedade (Gn.3:16; 6:5,12), a única conclusão que podemos chegar, à luz das Escrituras, é de que a igreja tem um papel a desempenhar na sociedade e que, enquanto corpo de Cristo e enquanto grupo social, não é possível admitir-se uma igreja que seja totalmente ausente da melhoria das condições de vida em sociedade.
A mensagem do Evangelho é, em si, uma mensagem que leva o homem a ter esperança não só de uma vida eterna com Deus, já iniciada desde a salvação na pessoa de Jesus Cristo, mas também de uma vida melhor sobre a face da Terra até o dia da glorificação. O tema do Evangelho é o “reino de Deus” (Mc.1:15) e este reino envolve não só a restauração da comunhão entre Deus e o homem, mas também o estabelecimento de uma comunhão entre os homens, de uma esfera de justiça , paz  e alegria no Espírito Santo (Jo.15:12; Rm.14:17; I Jo.3:14-19).
- Já em Israel, o Senhor já demonstrava a necessidade de se ter uma efetiva ação social na vida sobre a face da Terra. A lei de Moisés tinha diversos dispositivos para diminuir a desigualdade social entre os integrantes da sociedade, bem como para evitar que as camadas mais simples da população viessem, pela indigência, a sofrer além dos limites suportáveis ou, mesmo, a morrer de fome, como, por exemplo, nas regras referentes ao ano sabático (Lv.25:1-7), ao ano do jubileu (Lv.25:8-55), à respiga (Lv.19:10), ao dízimo (Nm.18:21-32; Dt.14:28,29; 26:12-15), ao salário dos trabalhadores (Lv.19:13) e ao penhor de bens essenciais à pessoa (Ex.22:26; Dt.24:6).
- Em todas estas disposições, Deus mostra, claramente, que, no meio do Seu povo, deveria haver respeito às pessoas e à sua dignidade, que os homens e mulheres estavam acima dos direitos e obrigações instituídos, ainda que legitimamente e de acordo com a lei, de modo que não se toleraria uma exploração desmedida de um homem em relação a outro, nem se poderia desamparar e deixar desprotegidos os indivíduos mais vulneráveis, identificados no texto bíblico como sendo “órfãos” e “viúvas”.
- Estas disposições, que nem sempre foram cumpridas pelo povo de Israel (basta ver, por exemplo, que o cativeiro da Babilônia durou 70 anos precisamente para que se cumprissem os anos sabáticos ignorados pelos israelitas durante a sua estada na Terra de Canaã – II Cr.26:21), persistem no tempo da dispensação da Igreja, vez que não decorrem da dispensação da lei, mas do próprio caráter divino, visto que Deus não muda e n’Ele não há sombra de variação (Ml.3:6; Tg.1:17).
- A Igreja, o Israel de Deus (Gl.6:16), deve seguir esta mesma linha de misericórdia e de respeito à dignidade da pessoa humana determinados por Deus ao Seu povo, visto que é participante da natureza divina, que quer que o homem, feito à Sua imagem e semelhança, tenha, na vida em sociedade, a dignidade que lhe é peculiar, que lhe foi dada por ato criativo de Deus.
II – A AÇÃO SOCIAL NO MINISTÉRIO TERRENO DE JESUS – O EXEMPLO DO REI
- Muitos poderão objetar o que estamos a dizer, afirmando que o fato de a lei de Moisés ter determinado uma conduta de ação social, de atendimento aos mais vulneráveis e de proeminência do homem sobre todas as relações sociais, é apenas uma constatação do que havia no tempo da lei, quando Deus constituiu um povo étnico, biológico e físico, onde se deveria, mesmo, ter normas relativas ao convívio social. Sendo, porém, a Igreja um povo espiritual e não sendo o reino de Deus deste mundo (cfr. Jo.18:36), não haveria qualquer espaço para uma “ação social” para a Igreja, sendo pois, algo completamente alheio à tarefa da Igreja o envolvimento com este assunto que seria, quando muito, apenas um desvio espiritual, em outras palavras, uma “apostasia”.
- Não negamos que haja quem pense assim no meio das igrejas locais evangélicas, pensamento este, aliás, que é explicado historicamente, tendo em vista a preocupação, principalmente no final do século XIX e início do século XX, com a infiltração do pensamento materialista e liberal entre muitos teólogos e pastores, que deram surgimento a um movimento que ficou conhecido como “evangelismo social” ou “evangelicalismo social”, que, ao mesmo tempo em que se despertava para a necessidade de uma atuação social da Igreja, também passava a compartilhar com algumas ideias doutrinárias que acabaram desacreditando a linha social defendida.
- Entretanto, como bem assinala o pastor presbiteriano Rev. Dr. Antonio José do Nascimento Filho, em seu excelente trabalho O Papel da Ação Social na Evangelização e Missão na América Latina: uma visão contemporânea (Campinas: LPC Comunicações, 1999. 105p.), este posicionamento não corresponde à realidade das Escrituras, que, em todo o seu conjunto, mas também em o Novo Testamento, demonstram claramente que a ação social é um dever imposto à Igreja, o atual povo de Deus sobre a face da Terra.

- Todos dizemos, a começar daqueles que se dizem inimigos da “ação social”, que Jesus é o cumprimento da lei e dos profetas, e o dizemos não porque sejamos “iluminados”, mas porque foi precisamente o que disse o Senhor a respeito (Mt.5:17) e, neste ponto, o Senhor simplesmente exigiu que a justiça de Seus discípulos, ou seja, da Sua igreja, deveria exceder a dos escribas e fariseus, sendo esta uma condição “sine qua non” para a entrada no reino dos céus (Mt.5:20). Só por este motivo, já vemos que o que estava apontado como figura ou símbolo na lei de Moisés, deveria ser cumprido e efetivado, com muito maior profundidade, pelos discípulos de Cristo. É, aliás, este o tema do sermão do monte.
- Pois bem, se Jesus é o cumprimento da lei e dos profetas, ao apreciarmos o Seu ministério terreno, teremos o parâmetro a ser seguido pela Sua Igreja que, afinal de contas, é o Seu corpo. Se assim é, a questão da “ação social” se resolve por uma simples questão: Jesus Cristo fez ação social em Seu ministério terreno?
A resposta é afirmativa. Em todos os instantes que vemos o Senhor Jesus agindo, vemos que a ação social estava presente, fazia parte do Seu ministério. Já no limiar do Seu ministério, quando estava sendo tentado pelo diabo, em resposta ao Tentador, o Senhor citou o livro de Deuteronômio: “nem só de pão viverá o homem, mas de toda a Palavra que procede da boca de Deus” (Mt.4:4b).
- A frase de Cristo é muito utilizada para mostrar a importância e supremacia da Palavra de Deus, mas contém também um ensino que é, por vezes, negligenciado. Jesus, com todas as letras, diz que o homem precisa do pão material, embora sua vida não se reduza a isto. Estava, sim, a passar fome no deserto, pois havia um propósito divino para tanto (Jesus estava em jejum para poder enfrentar e vencer o diabo), mas isto não queria dizer que o homem não precisa de pão material para sobreviver. Muito pelo contrário, nas duas multiplicações de pães, Jesus mostrou a Sua preocupação com a alimentação da multidão que O ouvia (Mt.14:15,16; 15:32). Vemos, pois, que, em Seu ministério, Jesus sempre demonstrou cuidado para com a satisfação das necessidades físicas dos que O cercavam.
- Em Nazaré, cidade onde foi criado, em Sua pregação na sinagoga, depois de ter sido tentado pelo diabo, revela este lado “material” de Seu ministério terreno. Disse que havia sido ungido para evangelizar os pobres, a curar os quebrantados do coração, a apregoar liberdade aos cativos e dar vista aos cegos, a pôr liberdade os oprimidos e anunciar o ano aceitável do Senhor (Lc.4:18,19). Em todas estas atividades, embora haja um sentido espiritual evidente, não se pode, também descartar o aspecto material.
- Jesus, em muitas ocasiões, referiu-Se aos pobres e não só no sentido espiritual da palavra, ou seja, aqueles que se fazem dependentes de Deus, carentes de Deus e aceitam a Sua soberania, mas também no sentido material da expressão, pois, se assim não fosse, como entender que Jesus possuía uma bolsa para os pobres (Jo.12:6; 13:29), bem como mulheres que contribuíam financeiramente para este serviço (Lc.8:3)?
- Outra demonstração de que o ministério de Jesus também abrangia a ação social vemos no próprio comportamento dos discípulos que, nos tempos apostólicos, sempre cuidaram dos necessitados, particularmente das viúvas, como nos atestam textos como At.2:45; 6:1; II Co.9; I Tm.5:3-5. Vemos, portanto, que, se os discípulos assim procediam é porque assim havia sido o procedimento do seu Mestre e Senhor, a quem imitavam.
- O ensino de Jesus a respeito do amor ao próximo, que foi tão bem ilustrado na parábola do bom samaritano, é mais uma demonstração de que não é possível um verdadeiro e genuíno cristianismo sem uma “ação social”. Amar o próximo, como ensina nessa parábola, é superar todas as barreiras culturais e fazer o bem ao semelhante, de modo desinteressado e incondicional. Aliás, o apóstolo Pedro, ao sintetizar o ministério de Cristo, disse que Ele andava “fazendo bem” (At.10:38), a demonstrar, pois, que a “ação social” era um dos sustentáculos do ministério terreno do Senhor.
III – A AÇÃO SOCIAL E AS DOUTRINAS BÍBLICAS
- O já mencionado pastor Antonio José do Nascimento Filho é feliz ao mostrar que a ação social é uma consequência inevitável e indispensável de algumas doutrinas bíblicas, o que demonstra a sua necessidade no cotidiano da Igreja. Para o referido estudioso das Escrituras, a ação social é consequência das seguintes doutrinas bíblicas:
a) Doutrina de Deus – Ao efetuar “ação social”, a Igreja mostra aos homens que Deus é justo e misericordioso, visto que a “ação social” visa instituir a justiça e é uma demonstração da misericórdia, atributos divinos por excelência.
b) Doutrina de Cristo – Ao efetuar “ação social”, a Igreja mostra que Jesus veio para servir e não para ser servido. O Cristo, Servo do Senhor, que ama e tem compaixão de toda a humanidade é mostrado quando a Igreja pratica “ação social”.
c) Doutrina do Reino de Deus – Ao efetuar “ação social”, a Igreja, desde já, adianta o que é o Reino de Deus, torna realidade, ainda que parcial e tênue, o que está a pregar e a esperar com a vitória final sobre o mal e o pecado a ser realizada pelo seu Rei, o Senhor Jesus.
d) Doutrina do Homem – Ao efetuar “ação social”, a Igreja mostra o devido valor que Deus dá ao homem e a posição singular dada ao homem na ordem cósmica. A Igreja, ao praticar a “ação social”, realça a dignidade da pessoa humana.
e) Doutrina da Igreja – Ao efetuar “ação social”, a Igreja mostra ao mundo que é um povo especial, zeloso de boas obras, a agência do reino de Deus na Terra. Comprova, com fatos (e contra fatos, não há argumentos), que Jesus ama e veio salvar a humanidade.

- Podemos, ainda, ante a “ação social” da Igreja, vermos características de outras doutrinas bíblicas, a saber:
f) Doutrina do Espírito Santo – A “ação social” da Igreja mostra, claramente, que a Igreja tem, dentro de Si, o Espírito Santo, o Consolador, aquele que vem dar alívio e conforto aos homens.
g) Doutrina da Salvação – A “ação social” da Igreja mostra o que é a salvação em Cristo Jesus, uma salvação que não se circunscreve a partes do homem, mas ao homem integral: corpo, alma e espírito.
h) Doutrina do Pecado – A “ação social” da Igreja leva os homens a perceber a injustiça reinante na sociedade e que isto é resultado do pecado, efeito nefasto da rebelião do homem contra Deus.
- Como se verifica, pois, a “ação social” da Igreja é uma atividade que muito colabora para não só a evangelização, como também para o próprio aperfeiçoamento dos santos, pois, com estas “boas obras”, vemos claramente que os homens são levados a glorificar ao nosso Pai que está nos céus.
- É importante, neste instante, evidenciar aqui uma distinção que costuma ser feita entre “serviço social” e “ação social. Até aqui temos tratado “ação social” num sentido genérico, tal qual o definimos supra, ou seja, como o conjunto de atividades que buscam trazer às pessoas as condições mínimas para a sua sobrevivência e dignidade na sociedade. No entanto, há uma distinção entre “serviço social” e “ação social”.
- O “serviço social” é identificado com o conjunto de atividades que têm, por finalidade, a satisfação imediata de carências surgidas num determinado grupo de pessoas, uma ação de caráter “curativo”, um remédio para uma necessidade surgida. Já a “ação social” é identificada como um conjunto de atividades que visa não a satisfação de uma necessidade, mas a eliminação da causa desta necessidade, que tem em vista a modificação do quadro existente, a alteração da própria sociedade, tornando-a mais justa.
- John Stott bem ilustra a distinção entre “serviço social” e “ação social”, ao afirmar o seguinte: “A cruz é uma revelação da justiça de Deus tanto como de Seu amor. Isto é o porquê a comunidade da cruz deveria se concentrar tanto com a justiça social como com a filantropia amorosa. Nunca é suficiente ter piedade das vítimas de injustiça, se não fazemos nada para mudar a situação dos injustiçados. Os Bons Samaritanos sempre serão necessários para socorrer aqueles que são assaltados e roubados; todavia, seria bem melhor libertar a estrada de Jerusalém-Jericó de salteadores (extraído de “A Cruz de Cristo” - Leicester and Downers Grove: IVP, 1986 -  p. 292  apud Evangelismo e ação social. Trad. de Felipe Sabino Araújo Neto, end. cit.).
- Assim, como ensina Stott, o “serviço social” é a filantropia amorosa, é a ajuda ao necessitado, suprindo a sua necessidade imediata, mas a “ação social” envolve algo maior, que é a própria luta e esforço para que as condições que causam a necessidade sejam retiradas, o que, inclui a atuação sócio-política, tendente a reverter as estruturas injustas da sociedade.
OBS: Oportuna, a propósito, a afirmação feita nas diretrizes da ação evangelizadora da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que pauta a ação da Igreja Romana em nosso país entre 2011 e 2015, que ora reproduzimos: “ 21.Os critérios que regem as leis do mercado, do lucro e dos bens materiais regulam também as relações humanas, familiares e sociais, incluindo certas atitudes religiosas. Crescem as propostas de felicidade, realização e sucesso pessoal, em detrimento do bem comum e da solidariedade. Não raras vezes, o individualismo desconsidera as atitudes altruístas, solidárias e fraternas. Por vezes, os pobres são considerados supérfluos e descartáveis.14 Desta forma, ficam comprometidos o equilíbrio entre os povos e nações, a preservação da natureza, o acesso à terra para trabalho e renda, entre outros fatores. É preciso pensar na função do Estado, na redescoberta de valores éticos, para a superação da corrupção, da violência, do narcotráfico, bem como o tráfico de pessoas e armamentos. A consciência de concidadania está comprometida. Em situação de contradições e perplexidades, o discípulo missionário reage, segundo o espírito das bem-aventuranças (cf. Mt 5,1ss), em defesa e promoção da vida, negada ou ameaçada por várias formas de banalização e desrespeito. Como não reagir diante da manipulação de embriões, homicídios, prática do aborto provocado, ausência de condições mínimas para uma vida digna com educação, saúde, trabalho, moradia, enfim, da ausência de efetiva proteção à vida e à família, às crianças e idosos, com jovens despreparados sem oportunidade para ocupação profissional?” (Documentos da CNBB – 94: Diretrizes gerais da ação evangelizadora da Igreja no Brasil 2011-2015, p.33. Disponível em: http://www.cnbb.org.br/diretrizes/ Acesso em 20 jul. 2011).
III – O AMOR AO PRÓXIMO COMO CONDIÇÃO PARA A AÇÃO SOCIAL DA IGREJA
- Já dissemos que uma das demonstrações de que a “ação social” da Igreja é uma necessidade é que é ele a demonstração do próprio “amor ao próximo”, que Jesus considerou como sendo um dos dois mandamentos a que se resumia a lei e os profetas (Mt.22:39,40).
- Sendo o amor  uma característica indispensável para quem diz ser filho de Deus, é como se fosse o próprio DNA espiritual do cristão sincero e verdadeiro, devemos observar que este amor não é apenas a essência da comunhão entre Deus e o homem, o próprio núcleo da vida espiritual, mas é, como afirma Paulo, o primeiro “gomo” do fruto do Espírito (Gl.5:22), ou seja, necessariamente este amor tem de se traduzir em atitudes, em ações, tem de se manifestar fora do indivíduo.
OBS: “…Ao descobrir-se amado por Deus, o homem compreende a própria dignidade transcendente, aprende a não se contentar de si e a encontrar o outro, em uma rede de relações cada vez mais autenticamente humanas. Feitos novos pelo amor de Deus, os homens são capacitados a transformar as regras e a qualidade das relações, inclusive as estruturas sociais; são pessoas capazes de levar a paz onde há conflitos, de construir e cultivar relações fraternas onde há ódio, de buscar a justiça onde prevalece a exploração do homem pelo homem. Somente o amor é capaz de transformar de modo radical as relações que os seres humanos têm entre si.…” (PONTÍFICIO CONSELHO “JUSTIÇA E PAZ”. Compêndio da doutrina social da Igreja, n. 4)
- Não foi por outra razão que Deus, ao entregar a Moisés a lei, estabeleceu que o resumo de todos os mandamentos fosse “Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu poder.”(Dt.6:5). Só assim poderia haver a guarda de todos os mandamentos e, por conseguinte, temor a Deus e vida (cfr. Dt.6:1,2), mandamento que foi endossado por Cristo, quando indagado a respeito do que era mais importante na lei (Mt.22:37).
OBS: É interessante notar que a declaração de Dt.6:5 vem imediatamente após a declaração de Dt.6:4, conhecida entre os judeus como a “Shemá”, a profissão de fé israelita. O mestre judeu Baal Hatorim (1270-1350) sugere que esta profissão de fé significa testemunho e que, cada um dos judeus, quando recita a “Shemá” (que, no ritual judaico, deve ser pronunciada por todo judeu pela manhã e pela noite), testemunha a divindade de Deus e aceita o jugo do Seu reino. Ora, se assim considerarmos, vemos, claramente, que o amor é a demonstração concreta do testemunho de um servo de Deus.
- Assim na lei de Moisés, apesar de todo o seu rigor, está bem especificado que o fundamento, a essência do relacionamento de Deus com o homem é o amor e que este amor não se limitava tão somente ao interior do homem que aceita Cristo, mas que se espraia aos semelhantes, tanto que Jesus fez questão de complementar a inquirição do doutor da lei com uma afirmação extremamente relevante: “e o segundo, semelhante a este, é: amarás o próximo como a ti mesmo.” (Mt.22:39).
- Deste modo, vemos que o amor divino, quando passa a existir no ser humano, o que somente é possível mediante a salvação, gera uma fonte de água que jorra para a vida eterna (Jo.4:14). Se é fonte de água que jorra, é água em movimento; se é água em movimento, é água que atinge outros lugares; se é água que atinge outros lugares, é água que leva a vida eterna até estes outros lugares. O homem salvo possui amor que se manifesta:
a) em direção a Deus – dimensão vertical
b) em direção aos outros homens – dimensão horizontal
c) em direção a si mesmo – dimensão interior
- O apóstolo Paulo, ao escrever para os crentes de Tessalônica, vai tratar, precisamente, desta “dimensão horizontal”, ou seja, do amor em direção aos outros homens, do que, na Versão Almeida Revista e Corrigida, é chamado de “caridade fraternal”, que, em outras versões, é denominado de “amor fraternal” e que corresponde à palavra grega “philadelphia”, que é uma palavra composta de “philia”, o amor amizade de que já tratamos supra e “adelphos”, que significa “irmão” e que se constitui, precisamente, no fator que leva a Igreja a efetuar uma “ação social”.
O amor a Deus é pressuposto para que se tenha amor ao próximo. Não é possível amar o próximo sem que antes se ame a Deus. Daí porque não podermos confundir o amor ao próximo com o mero exercício de filantropia, com dó ou qualquer outro sentimento que tenha em vista a ajuda circunstancial a outrem, como, aliás, defendem aqueles que acham que as boas obras de alguém ocasionam a este alguém algum progresso espiritual.
- Quem ama a Deus, ama o próximo, mas quem não ama a Deus, não ama o próximo. É mentira a afirmação de alguém que diz que está evoluindo espiritualmente pelo simples fato de ajudar os necessitados com esmolas ou com trabalho voluntário. Estas atitudes de benemerência não significam amor ao próximo, pois o verdadeiro amor ao próximo é decorrência do amor a Deus e, portanto, é resultado da obediência à Palavra de Deus.
- Mas, do mesmo modo que estão errados aqueles que acham que as boas obras são suficientes para salvação, também estão enganados aqueles que veem numa vida religiosa devocional a salvação. A Bíblia é claríssima: quem ama a Deus, ame a seu irmão e que quem aborrece a seu irmão e diz que ama a Deus é mentiroso e, portanto, alguém que não é filho de Deus, tanto que não morará eternamente com o Senhor na cidade santa, mas ficará do lado de fora pela sua mentira (Ap.21:8; 22:5).  Como afirma John Stott: “Nós somos enviados ao mundo, como Jesus, para servir. Porque isto é a expressão natural de nosso amor aos nossos próximos. Nós amamos. Nós vamos. Nós servimos. E nisto não temos (ou não deveríamos ter) nenhum motivo escondido. É verdade, o evangelho carece de visibilidade se meramente o pregamos, e carece de credibilidade se nós, que o pregamos, estamos interessados somente nas almas, e não temos interesse sobre o bem-estar dos corpos, situações e comunidades das pessoas. Todavia, a razão de nossa aceitação da responsabilidade social não é para dar primariamente ao evangelho uma visibilidade, nem uma credibilidade, nem mesmo para suprir alguma outra carência; mas, ao invés disso, para simplesmente demonstrar uma compaixão genuína. O amor não precisa se justificar. Ele meramente se expressa no serviço, não importa quando ele se mostre necessário.” (extraído de A Missão Cristã no Mundo Moderno - London: Falcon, 1975 - p. 30 apud Evangelismo e Ação Social. Trad. de Felipe Sabino Araújo Neto, end. Cit.).
Amar o próximo não é dizer a alguém que o ama, mas um amor que se mostra por atitudes concretas, por ações efetivas, por obras. Amor ao próximo não é amor de palavra nem de língua, mas amor por obras e em verdade (I Jo.3:18). Ainda nos dizeres de Stott: “No ministério de Jesus palavras e obras, pregação do evangelho e serviço misericordioso, andam de mãos dadas. Suas obras expressam suas palavras, e suas palavras explicam suas obras. Deve ser o mesmo conosco. As palavras são abstratas, elas necessitam serem incorporadas em feitos de amor. As obras são ambíguas, elas necessitam serem interpretadas pela proclamação do evangelho. Guarde as palavras e as obras juntas no serviço e no testemunho da Igreja. (extraído de “Evangelismo e Responsabilidade Social”, Southern Cross - Outubro de 1980 - p. 23 apud Evangelismo e ação social. Trad. de Felipe Sabino Araújo Neto, end. cit.)
- Amar o próximo é sentir compaixão por ele, ou seja, sentir a sua dor, como se fosse nossa e, assim, suprir as necessidades imediatas do nosso semelhante, lembrando que ele é tão imagem e semelhança de Deus quanto nós. O próximo é qualquer ser humano, como bem nos explicitou Jesus na parábola do bom samaritano, e este amor supera todo e qualquer preconceito, toda e qualquer barreira, toda e qualquer tradição.
Amar o próximo não é apenas ajudar alguém do ponto-de-vista material, mas, sobretudo, levar este alguém a uma vida de comunhão com Deus, a um equilíbrio em todos os aspectos da sua vida. Medidas emergenciais serão necessárias, como nos mostra a parábola do bom samaritano, mas é extremamente necessário que levemos o próximo a entender que deve, sobretudo, amar a Deus, para que também ame o próximo, como nós o amamos.
OBS: Oportuna a afirmação a respeito do documento que dá as diretrizes da ação evangelizadora da Igreja Romana no Brasil para os anos 2011-2015, “in verbis”: “71. Consciente de que precisa enfrentar as urgências que decorrem da miséria e da exclusão, o discípulo missionário também sabe que não pode restringir sua solidariedade ao gesto imediato da doação caritativa. Embora importante e mesmo indispensável, a doação imediata do necessário à sobrevivência não abrange a totalidade da opção pelos pobres. Antes de tudo, esta implica convívio, relacionamento fraterno, atenção, escuta, acompanhamento nas dificuldades, buscando, a partir dos próprios pobres, a mudança de sua situação. Os pobres e excluídos são sujeitos da evangelização e da promoção humana integral. Em tudo isso, a Igreja reconhece a importância da atuação no mundo da política e assim incentiva os leigos e leigas à participação ativa e efetiva nos diversos setores diretamente voltados para a construção de um mundo mais justo, fraterno e solidário.” (Documentos da CNBB-94: Diretrizes para a Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil 2011-2015, pp. 63-4. Disponível em:http://www.cnbb.org.br/diretrizes/ Acesso em 20 jul. 2011).
- Quando levamos as pessoas também a amar a Deus, estamos estabelecendo as condições para uma verdadeira transformação social, visto que a injustiça social somente será debelada quando o pecado for, igualmente, extirpado de cada ser humano. Como ensina o já tantas vezes mencionado John Stott: “O evangelismo é o maior instrumento de mudança social. Porque o evangelho muda pessoas, e pessoas mudadas podem mudar a sociedade. (extraído de Assuntos que Confrontam os Cristãos Hoje - London: Collins/Marshall Pickering, 1990) - p. 71 apud Evangelismo e ação social. Trad. de Felipe Araújo Sabino Neto. end.cit).
O amor ao próximo é determinado pelo Senhor, é Seu mandamento (Jo.15:12) e tem como exemplo o próprio amor que Cristo apresentou a nós, ou seja, o da completa renúncia para que desfrutássemos da vida eterna. Devemos assim amar os nossos irmãos: estarmos dispostos, inclusive, a dar nossa vida pelos irmãos, desde que isto os leve a uma vida de comunhão com Deus.
- Jesus nos amou primeiro, fez o que não podíamos fazer, mas nem por isso fez o que poderíamos e deveríamos fazer. Este é o limite do amor ao próximo: fazer aquilo que ele não pode fazer, mas ensinar-lhe a fazer o que pode e deve fazer.
- Quando amamos o próximo da forma determinada na Palavra de Deus, melhoramos sensivelmente o ambiente em que vivemos. O período áureo da história da humanidade, que será o reino milenial de Cristo, será caracterizado por este amor, teremos, enfim, a “civilização do amor”, que tanto almejamos e que tão distante está da nossa realidade atual.
- Esta civilização do amor já está delineada nos dez mandamentos dados a Moisés, onde Deus revela o Seu caráter ao povo que escolhera. Com efeito, ao observarmos os mandamentos, veremos que quatro deles dizem respeito ao relacionamento entre Deus e Israel (dimensão vertical: não terás outros deuses diante de mim, não farás imagem de escultura, não usarás o nome do Senhor em vão, guardarás o sábado), um é híbrido, pois diz respeito ao relacionamento entre Deus e Israel e entre os homens entre si (honrar pai e mãe para que o Senhor prolongue a vida) e cinco são inteiramente voltados para o relacionamento entre as pessoas (não matarás, não adulterarás, não furtarás, não dirás falso testemunho contra o teu próximo e não cobiçarás). Aqui, uma vez mais, vemos que a fonte de um bom relacionamento com o próximo é o bom relacionamento com Deus, mas também vemos como é extremamente indispensável que haja atitudes concretas para mostrar este amor ao próximo.
OBS: “…Atribuindo o fundamento destas leis à responsabilidade do homem diante de Deus, e não tão somente diante da sua consciência, Moisés pôde assegurar o seu cumprimento total em todas as circunstâncias e em todas as épocas. A transgressão de um mandamento da Torá não é apenas um crime contra a consciência ou o Estado, mas também um pecado religioso contra Deus, e se uma pessoa cumpre realmente os cinco primeiros mandamentos, dificilmente poderá transgredir os cinco últimos.…” (MELAMED, Meir Matzliah. A Lei de Moisés: Torá, com.Ex.20:1, p.215).
IV -  O NECESSÁRIO RESGATE DA AÇÃO SOCIAL
- Diante do que vimos até aqui, temos já esclarecido porque a ação social nas nossas igrejas locais deixa muito, mas muito mesmo a desejar. Vivemos um nítido processo de transformação de nossas igrejas locais em meras “multidões”, aglomerações de consumidores, cada vez mais interessados em si mesmos, em ter um “lenitivo espiritual” para o seu vazio espiritual, o que, não raro, leva estas pessoas a procurarem “doutores conforme as suas próprias concupiscências” (II Tm.4:3,4).

- Se a igreja local se desmonta como grupo social, tem se tornado um pouco mais distante o ideal de ser um grupo social relevante, cuja ação no meio da sociedade leve as pessoas, salvas ou não, a terem uma vida melhor, melhores condições de vida, a ter respeitada a sua dignidade como pessoa humana.
- Verdade é que sabemos que as Escrituras anunciam que, ao findar desta dispensação, sobrevirá um tempo particularmente difícil para a humanidade, onde a ditadura do Anticristo imporá uma desigualdade social cada vez mais intensa, desigualdade esta que já se evidencia como estão a mostrar, ano após ano, as estatísticas das Nações Unidas e outras organizações internacionais.
- No entanto, nós, enquanto servos do Senhor, não podemos esmorecer, até porque, quem pôs a sua mão ao arado e é apto para o Reino de Deus, não pode voltar atrás (Lc.9:62). A situação é cada vez mais difícil, dentro das próprias igrejas locais vemos perder-se a própria qualidade de grupo social na membresia, mas isto não pode servir de motivo ou razão para esmorecermos.
Devemos continuar a ajudar os necessitados, a começar pelos domésticos da fé (Gl.6:10), em especial, nós, brasileiros, que vivemos num dos países mais desiguais do mundo, conforme estatísticas das Nações Unidas. É momento de não só termos uma assistência social eficaz (que deve ir muito além do “quilo” nas ceias do Senhor), como também nos engajarmos em movimentos pela melhoria das condições de vida de nossa população, seja através da alimentação, seja através dos cuidados com crianças e adolescentes, seja através de iniciativas que minorem o desemprego crônico de nosso país, que atinge, segundo estatísticas do IBGE, entre os jovens de 16 a 25 anos a taxa de 27% em 2011 (Jornal da Band, edição de 13 de julho de 2011. Disponível em: http://videos.band.com.br/Programas/Jornal-da-Band?channel=587 Acesso em 14 jul. 2011), seja através do atendimento dos idosos, cada vez mais numerosos e mais necessitados na atualidade.
A Igreja deve ter a iniciativa de conscientizar os segmentos sociais a privilegiar o trabalho como fonte de subsistência do homem, como determinado pelo Senhor, e não a especulação financeira, a criminalidade e a exploração da população economicamente ativa para criação de mecanismos de dependência eterna aos menos favorecidos por meio de esmolas estatais, que não são mecanismos que podem ser tornados permanentes, sob pena de estagnação do país. A Igreja deve lutar pelo pão que é necessário a todo homem, mas também para que ele seja obtido com dignidade e mediante os meios estabelecidos pelo Senhor em Sua Palavra.
- Para tanto, porém, como dissemos supra, é mister que a Igreja dê o exemplo, que tenha, a partir de sua membresia, ações efetivas que mostrem ao mundo que somos diferentes e que cremos num Deus poderoso, justo e misericordioso. Enquanto nós mesmos nos mantivermos alheios ao sofrimento do irmão, egoístas e sem compaixão, seremos totalmente impotentes com relação ao lamentável estado de coisas que vive a nossa sociedade e, pior do que isto, cúmplices e envolvidos em toda a sorte de desatinos, desvios e corrupções, como, lamentavelmente, têm ocorrido em escândalos cada vez mais frequentes em nosso meio.
- Não se trata, evidentemente, de acharmos que a sociedade atual será perfeita e que a Igreja, por si só, estabelecerá um “paraíso na Terra”. Como diz Stott, “Os seguidores de Jesus são otimistas, mas não utópicos. É possível melhorar a sociedade; mas uma sociedade perfeita espera o retorno de Jesus Cristo” (extraído de “Que é o Homem?” —London: National Prayer Breakfast Committee, 1989— apud Evangelismo e ação social. Trad. de Felipe Sabino Araújo Neto. end.cit.).
A ação social da Igreja deve ser vista como um “importante negócio” (At.6:3), pois é assim que as Escrituras nos dizem ser tal atividade da Igreja. Trata-se de uma tarefa tão importante que os apóstolos criaram até uma função específica para dela cuidar, qual seja, a de “diácono” (At.6:3,5,6), palavra que, em grego, significa “servidor”, vez que deveriam eles servir às mesas, ou seja, cuidar da assistência aos necessitados.
- Vemos, pois, como o diaconato tem se desviado de seus propósitos bíblicos. Hoje em dia, o diaconato nada mais é que um “passo inicial” do ministério, nada mais é que uma atividade ritual de portaria, de recolhimento e contabilidade de contribuições e de serviço do pão e do vinho na ceia do Senhor, atividades que podem, sim, ser exercidas pelos diáconos, mas que não se constitui, em absoluto, no papel do diaconato. Urge voltarmos ao modelo bíblico, com diáconos que administrem a ação social da Igreja, que cuidem da parte material e espiritual desta assistência, que é um “importante negócio”, que deve ser dirigido pelo Espírito Santo através de homens de boa reputação, cheios do Espírito Santo e de sabedoria. A total ausência do diaconato, quase sempre numeroso nas igrejas locais, neste assunto é uma demonstração clara e inequívoca de quanto temos negligenciado a missão social da Igreja.
- Logicamente que a ação social da Igreja não se limita apenas ao “serviço social”, nem pode se circunscrever ao aspecto material. Por isso, não é desculpa a falta de recursos materiais para não se praticar atos de ação social. Quem não pode vestir, dar de comer ou dar abrigo a alguém, pode consolar, instruir, confortar, visitar. “…A bondade não consiste em dar presentes, mas na doçura e na generosidade do espírito. Pode-se dar dinheiro da algibeira sem nada que venha do coração. A bondade que se contenta com dar dinheiro não vale grande cousa e muitas vezes faz tanto mal como bem, mas a bondade que se traduz por uma verdadeira simpatia e um auxílio oportuno nunca deixa de dar bons resultados(…). A verdadeira bondade procura e favorece tudo o que pode servir para fazer o bem no presente e, olhando para o futuro, trabalha com o mesmo espírito para a elevação e a felicidade da humanidade.…” (SMILES, Samuel. Trad. de D. Amélia Pereira. O caráter, p.290-1).
- Neste passo, devemos sempre observar a lição do já tantas vezes mencionado John Stott para entendermos quea “ação social” é “parceira” da evangelização, ou seja, “…Como parceiros os dois pertencem um ao outro e, todavia, são independentes um do outro. Cada um permanece de pé por si mesmo e em seu próprio direito ao lado do outro. Nem é algum deles um meio para o outro, ou nem mesmo uma manifestação do outro. Porque cada um é um fim em si mesmo. Ambos são expressões de amor genuíno.
(extraído de “A Missão Cristã no Mundo Moderno” - London: Falcon, 1975 - p. 27).
Nesta ideia de parceria entre evangelização e “ação social”, precisamos nos livrar de dois equívocos apontados por Stott e muito bem sintetizados pelo reverendo congregacional paraibano Leonardo Félix, “in verbis”:
“…a. A primeira relação ver a ação social como um meio para o evangelismo. Ou seja, as ações sociais são uma dissimulação da nossa verdadeira intenção. Acabamos fingindo o amor na tentativa de pregarmos o evangelho. 
i. Por exemplo: Dar comida aos famintos com o objetivo de falar do evangelho, todavia sem se importar com a fome dos carentes. Como disse Stott, nesse caso: ‘O cheiro de hipocrisia permeia nossa filantropia’ (A missão cristã no mundo moderno, p.30).
b. Outro modo equivocado de relacionar evangelismo e ação social, ver a ação social como uma manifestação do evangelismo. Essa ideia ensina que evangelismo é o mesmo que uma restauração estrutural da sociedade através de ações sociais. Sendo assim, vestir os nus, dar comida aos pobres, lutar por justiça social e política é um cumprimento da missão cristã nesse mundo. Contudo, não percebe o evangelho como uma mensagem individual aos homens.…” (Responsabilidade social e a missão da Igreja. 27 mar. 2011. Disponível em:http://sermoes1.blogspot.com/2011/03/responsabilidade-social-e-missao-da.html Acesso em 16 jul. 2011).
- Assim, não podemos simplesmente fazer “serviço social” com a intenção de simplesmente pregar o Evangelho, não se preocupando em realmente resolver a questão social, nem tampouco achar que fazendo “ação social”, estaremos evangelizando, sem se preocupar que a salvação é individual e que o principal problema da sociedade é o pecado.
- O salvo pratica boas ações, tem “bondade” (Gl.5:22), que é “a boa qualidade”(na origem da palavra “bonitas”, em latim), é aquele que será convidado pelo Senhor a ingressar nas mansões celestiais porque, como prova de que era ramo da videira verdadeira, deu de comer ao faminto, hospedou o desabrigado, vestiu o desnudo, visitou o enfermo e o preso (Mt.25:34-40), faminto, desabrigado, desnudo, enfermo e preso que, além de terem tido suas necessidades atendidas, também entregaram suas vidas para Cristo e conosco entrarão nas mansões celestiais.
- Que Deus nos guarde de uma falsa conversão que, no dia do juízo final, será provada pela ausência de atos de bondade em nossas vidas (Mt.25:41-46). Pelo que temos praticado, qual será o nosso destino diante do Reto e Supremo Juiz?  Somos dos “figos bons” ou dos “figos maus” (Jr.24)? Que Deus nos desperte e que tenhamos benignidade e bondade em nossas ações, que é a ação social da Igreja.                                                                 
Colaboração para o Portal Escola Dominical – Dr.Caramuru Afonso Francisco