A Última Ceia Lição 11


A Instituição da Páscoa

O real sentido da última Ceia celebrada por Jesus narrada em Lucas 22.19,20, só é totalmente compreendida quando analisada à luz da Páscoa judaica (hb. Pessach). Essa festa, que era uma das mais grandiosas do antigo judaísmo, era celebrada pelos judeus como o “tempo de sua liberdade”. Era, sem dúvida, o mais querido de todos os dias santificados pelos judeus. O sentido simbólico desse rito está associado com a ideia de liberdade conforme expressado no livro de Êxodo capítulo 12.
“Falou o SENHOR a Moisés e a Arão na terra do Egito, dizendo: Este mesmo mês vos será o princípio dos meses; este vos será o primeiro dos meses do ano. Falai a toda a congregação de Israel, dizendo: Aos dez deste mês, tome cada um para si um cordeiro, segundo as casas dos pais, um cordeiro para cada casa. Mas, se a família for pequena para um cordeiro, então, tome um só com seu vizinho perto de sua casa, conforme o número das almas; conforme o comer de cada um, fareis a conta para o cordeiro. O cordeiro, ou cabrito, será sem mácula, um macho de um ano, o qual tomareis das ovelhas ou das cabras e o guardareis até ao décimo quarto dia deste mês, e todo o ajuntamento da congregação de Israel o sacrificará à tarde. E tomarão do sangue e pô-lo-ão em ambas as ombreiras e na verga da porta, nas casas em que o comerem. E naquela noite comerão a carne assada no fogo, com pães asmos; com ervas amargosas a comerão. Não comereis dele nada cru, nem cozido em água, senão assado ao fogo; a cabeça com os pés e com a fressura. E nada dele deixareis até pela manhã; mas o que dele ficar até pela manhã, queimareis no fogo. Assim, pois, o comereis: os vossos lombos cingidos, os vossos sapatos nos pés, e o vosso cajado na mão; e o comereis apressadamente; esta é a Páscoa do SENHOR. E eu passarei pela terra do Egito esta noite e ferirei todo primogênito na terra do Egito, desde os homens até aos animais; e sobre todos os deuses do Egito farei juízos. Eu sou o SENHOR. E aquele sangue vos será por sinal nas casas em que estiverdes; vendo eu sangue, passarei por cima de vós, e não haverá entre vós praga de mortandade, quando eu ferir a terra do Egito. E este dia vos será por memória, e celebrá-lo-eis por festa ao SENHOR; nas vossas gerações o celebrareis por estatuto perpétuo. Sete dias comereis pães asmos; ao primeiro dia, tirareis o fermento das vossas casas; porque qualquer que comer pão levedado, desde o primeiro até ao sétimo dia, aquela alma será cortada de Israel. E, ao primeiro dia, haverá santa convocação; também, ao sétimo dia, tereis santa convocação; nenhuma obra se fará neles, senão o que cada alma houver de comer; isso somente aprontareis para vós. Guardai, pois, a Festa dos Pães Asmos, porque naquele mesmo dia tirei vossos exércitos da terra do Egito; pelo que guardareis este dia nas vossas gerações por estatuto perpétuo. 
No primeiro mês, aos catorze dias do mês, à tarde, comereis pães asmos até vinte e um do mês à tarde. Por sete dias não se ache nenhum fermento nas vossas casas; porque qualquer que comer pão levedado, aquela alma será cortada da congregação de Israel, assim o estrangeiro como o natural da terra. Nenhuma coisa levedada comereis; em todas as vossas habitações comereis pães asmos. Chamou, pois,
Moisés a todos os anciãos de Israel e disse-lhes: Escolhei, e tomai vós cordeiros para vossas famílias, e sacrificai a Páscoa. Então, tomai um molho de hissopo, e molhai-o no sangue que estiver na bacia, e lançai na verga da porta, e em ambas as ombreiras, do sangue que estiver na bacia; porém nenhum de vós saia da porta da sua casa até à manhã. Porque o SENHOR passará para ferir aos egípcios, porém, quando vir o sangue na verga da porta e em ambas as ombreiras, o SENHOR passará aquela porta e não deixará ao destruidor entrar em vossas casas para vos ferir. Portanto, guardai isto por estatuto para vós e para vossos filhos, para sempre. E acontecerá que, quando entrardes na terra que o SENHOR vos dará, como tem dito, guardareis este culto. E acontecerá que, quando vossos filhos vos disserem: Que culto é este vosso? Então, direis: Este é o sacrifício da Páscoa ao SENHOR, que passou as casas dos filhos de Israel no Egito, quando feriu aos egípcios e livrou as nossas casas. Então, o povo inclinou-se e adorou” (Ex 12.1-27).

A Celebração da Páscoa no Judaísmo

Ainda no final do século I o Patriarca judeu Raban Gamaliel destaca que a Páscoa não era um ritual a ser vivido apenas por uma geração, mas por todos os judeus ao longo da história: “Em cada geração cada um deve encarar-se a si próprio como se também ele houvesse saído do Egito. Não foram só os nossos antepassados que o Santificado redimiu naquela ocasião, mas através deles, a nós todos”.1
E é exatamente isso o que a história testemunha. “A lembrança do cativeiro egípcio, observa a Enciclopédia Judaica, embora esse fato tenha ocorrido pelo menos há trinta e dois séculos, continua como uma ferida aberta a doer na consciência macerada do judeu. Na realidade, ele nunca considerou — a não ser na Idade de Ouro da grandeza de seu povo na Terra de Israel — que o Cativeiro jamais tivesse chegado ao fim. Essa ideia é expressa de maneira tocante na oração aramaica do Seder (serviço doméstico que inicia a celebração do Pessach); ela apresenta o tema do dia santificado como se fora o coro de abertura de uma tragédia grega. Quando o chefe da casa, envolto no kitel branco e o solidéu à cabeça, cumprindo o papel que lhe cabe nessa ocasião, de sacerdote oficiante, eleva gravemente a bandeja com as três matzot cerimoniais e as mostra aos presentes reunidos, ele entoa no tom menor adequando às vicissitudes muito presentes na memória: ‘Vejam! Este é como o pão da aflição que nossos pais comeram na terra do Egito’”.2
Essa forma de celebrar a Páscoa, como demonstrou a citada Enciclopédia, reflete o costume dos judeus logo após a destruição de Jerusalém pelos romanos no ano 70 d.C. Embora a cerimônia tenha sofrido alterações em suas formas litúrgicas ao longo dos séculos, todavia a sua essência continua a mesma — manter na mente do devoto a ideia de libertação.3 Na idade média, por exemplo, a celebração da páscoa era envolta em muita melancolia, mesmo com a presença das festivas canções de ações de graças. O celebrante, que em geral era o chefe da família, levantava um dos quatro cálices usados durante o ritual e dizia: “Não foi uma só, uma vez, a se levantar contra nós para nos destruir, mas em todas as gerações se levantaram contra nós para nos destruir. O Santificado — abençoado seja Ele — porém, sempre nos liberta das mãos deles”.4
O Bedikat Chametz — a Busca pelo Fermento!

Uma outra celebração observada cuidadosamente pelos judeus era a festa dos pães asmos. Assim como a Páscoa, o ritual dos pães sem fermento era rigorosamente observado pelos Judeus. Ao longo dos anos foi associada à mesma um extremo rigorismo ético.5
De acordo com a Enciclopédia Judaica, na noite precedente da Páscoa, é exigido de todo lar judeu que observe o que denominam de cerimônia do Bedikat Chametz, isto é, a “A Busca do Fermento”.
O ritual extremamente meticuloso orienta o chefe da família a andar por toda a casa a procura de pedacinhos de pão fermentado — o “chametz”, durante os dias que dura a cerimônia pascal. O propósito de tal rito é certificar-se de que somente o “matzar”, isto é, o pão sem fermento pode ser comido.
O cerimonial detalha ainda que aquele que foi encarregado dessa missão deve munir-se de uma vela, uma colher de pau, e um espanador de penas de galinha ou de ganso para que caso encontre algum resíduo de pão possa espanar para dentro da colher. Tendo feito isso então ele pronuncia a bênção: “Abençoado seja tu, (...) que ordenaste que removêssemos o fermento”.
No dia seguinte ele queima o fermento encontrado! Se porventura alguém fosse encontrado com fermento durante esse período era punido com a pena de 39 chicotadas! O ritual, portanto, era em extremo rigoroso no antigo judaísmo a ponto dos utensílios da cozinha serem banhados em água fervente, ou vigorosamente esfregados na areia.
Embora essa tradição hebraica revele vários aspectos de um judaísmo posterior, e que em muitos aspectos difira dos costumes adotados pelo cerimonial mosaico (Ex 12), todavia mostra como o povo judeu ao longo do tempo levou a sério a simbologia por trás do uso do fermento em suas cerimônias religiosas.
Essa simbologia é usada pelo apóstolo Paulo quando instrui os cristãos de Corinto. Ao reprovar o mau comportamento de um membro daquela igreja, Paulo aconselha os crentes a se livrarem do “velho fermento” e a se revestirem com os “asmos da sinceridade”.
“Geralmente, se ouve que há entre vós fornicação e fornicação tal, qual nem ainda entre os gentios, como é haver quem abuse da mulher de seu pai. Estais inchados e nem ao menos vos entristecestes, por não ter sido dentre vós tirado quem cometeu tal ação. Eu, na verdade, ainda que ausente no corpo, mas presente no espírito, já determinei, como se estivesse presente, que o que tal ato praticou, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, juntos vós e o meu espírito, pelo poder de nosso Senhor Jesus Cristo, seja entregue a Satanás para destruição da carne, para que o espírito seja salvo no Dia do Senhor Jesus. Não é boa a vossa jactância.

Não sabeis que um pouco de fermento faz levedar toda a massa? Alim- pai-vos, pois, do fermento velho, para que sejais uma nova massa, assim como estais sem fermento. Porque Cristo, nossa páscoa, foi sacrificado por nós. Pelo que façamos festa, não com o fermento velho, nem com o fermento da maldade e da malícia, mas com os asmos da sinceridade e da verdade. Já por carta vos tenho escrito que não vos associeis com os que se prostituem; isso não quer dizer absolutamente com os devassos deste mundo, ou com os avarentos, ou com os roubadores, ou com os idólatras; porque então vos seria necessário sair do mundo. Mas, agora, escrevi que não vos associeis com aquele que, dizendo-se irmão, for devasso, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou roubador; com o tal nem ainda comais. Porque que tenho eu em julgar também os que estão de fora? Não julgais vós os que estão dentro? Mas Deus julga os que estão de fora. Tirai, pois, dentre vós a esse iníquo” (1 Co 5.1-13).

A Última Ceia

A Páscoa judaica era apenas um tipo do qual Jesus era o antítipo. Paulo disse isso quando escreveu: “Cristo, nossa páscoa, foi sacrificado por nós” (1 Co 5.7). O escritor Gerad Von Groningen destaca que: “O cordeiro da Páscoa, em si mesmo, tem significação messiânica como tipo. Seu caráter e qualidade tinha de ser sem mancha ou defeito. Nenhuma das evidências dos efeitos ruinosos do pecado e seus resultados poderia estar presente. O próprio cordeiro tinha de ser perfeito para ser aceitável a Yahweh como um substituto para o povo oprimido a sofrer sobre o cativeiro egípcio. Ele tinha de ser completamente consumido, sem que seus ossos fossem quebrados, para indicar a extrema necessidade de uma total libertação e integral submissão a este requisito”.6
Ainda de acordo com Groningen o cordeiro da Páscoa também possuía um aspecto escatológico definido. Ele devia ser morto, não somente no tempo do êxodo, mas anualmente. Yahweh, falando por meio de Moisés, ordenou que a cada ano o cordeiro da Páscoa fosse selecionado, morto e consumido (12.14) em cada família. Assim, as famílias deveriam considerar, retrospectivamente, sua libertação. Isto, por sua vez, falava prospectivamente de uma libertação plena, total, que viria por meio de um Cordeiro Pascal cuja morte sacrificial, uma vez cumprida na história, traria completa redenção e, portanto, tornaria desnecessário Qualquer novo derramamento de sangue do cordeiro pascal”.7

A Instituição da Santa Ceia

Quando Jesus pediu aos seus discípulos que preparassem a Páscoa não há dúvida de que tinha em mente esses fatos.8
“Estava, pois, perto a Festa dos Pães Asmos, chamada de Páscoa. E os principais dos sacerdotes e os escribas andavam procurando como o matariam, porque temiam o povo. Entrou, porém, Satanás em Judas, que tinha por sobrenome Iscariotes, o qual era do número dos doze. E foi e falou com os principais dos sacerdotes e com os capitães de como lho entregaria, os quais se alegraram e convieram em lhe dar dinheiro. E ele concordou e buscava oportunidade para lho entregar sem alvoroço. Chegou, porém, o dia da Festa dos Pães Asmos, em que importava sacrificar a Páscoa. E mandou a Pedro e a João, dizendo: Ide, preparai-nos a Páscoa, para que a comamos. E eles lhe perguntaram: Onde queres que a preparemos? E ele lhes disse: Eis que, quando entrardes na cidade, encontrareis um homem levando um cântaro de água; segui-o até à casa em que ele entrar. E direis ao pai de família da casa: O mestre te diz: Onde está o aposento em que hei de comer a Páscoa com os meus discípulos? Então, ele vos mostrará um grande cenáculo mobilado; aí fazei os preparativos. E, indo eles, acharam como lhes havia sido dito; e prepararam a Páscoa. E, chegada a hora, pôs-se à mesa, e, com ele, os doze apóstolos. E disse-lhes: Desejei muito comer convosco esta Páscoa, antes que padeça, porque vos digo que não a comerei mais até que ela se cumpra no Reino de Deus. E, tomando o cálice e havendo dado graças, disse: Tomai-o e reparti- o entre vós, porque vos digo que já não beberei do fruto da vide, até que venha o Reino de Deus. E, tomando o pão e havendo dado graças, partiu- o e deu-lho, dizendo: Isto é o meu corpo, que por vós é dado; fazei isso em memória de mim. Semelhantemente, tomou o cálice, depois da ceia, dizendo: Este cálice é o Novo Testamento no meu sangue, que é derramado por vós” (Lc 22.1-20).
Jesus tinha consciência de que Ele era o Cordeiro de Deus que tiraria o pecado do mundo, conforme dissera o Batista (Jo 1.29). Por isso, disse a seus discípulos: “Desejei muito comer convosco esta Páscoa, antes que padeça” (Lc 19. 15).

A Santa Ceia no Ensino de Paulo

No Novo Testamento encontramos o apóstolo Paulo dando lições precisas sobre a ceia do Senhor.
“Nisto, porém, que vou dizer-vos, não vos louvo, porquanto vos ajuntais, não para melhor, senão para pior. Porque, antes de tudo, ouço que, quando vos ajuntais na igreja, há entre vós dissensões; e em parte o creio. E até importa que haja entre vós heresias, para que os que são sinceros se manifestem entre vós. De sorte que, quando vos ajuntais num lugar, não é para comer a Ceia do Senhor. Porque, comendo, cada um toma antecipadamente a sua própria ceia; e assim um tem fome, e outro embriaga-se. Não tendes, porventura, casas para comer e para beber? Ou desprezais a igreja de Deus e envergonhais os que nada têm? Que vos direi? Louvar-vos-ei? Nisso não vos louvo. Porque eu recebi do Senhor o que também vos ensinei: que o Senhor Jesus, na noite em que foi traído, tomou o pão; e, tendo dado graças, o partiu e disse: Tomai, comei; isto é o meu corpo que é partido por vós; fazei isto em memória de mim. Semelhantemente também, depois de cear, tomou o cálice, dizendo: Este cálice é o Novo Testamento no meu sangue; fazei isto, todas as vezes que beberdes, em memória de mim. Porque, todas as vezes que comerdes este pão e beberdes este cálice, anunciais a morte do Senhor, até que venha. Portanto, qualquer que comer este pão ou beber o cálice do Senhor, indignamente, será culpado do corpo e do sangue do Senhor. Examine-se, pois, o homem a si mesmo, e assim coma deste pão, e beba deste cálice. Porque o que come e bebe indignamente come e bebe para sua própria condenação, não discernindo o corpo do Senhor. Por causa disso, há entre vós muitos fracos e doentes e muitos que dormem. Porque, se nós nos julgássemos a nós mesmos, não seriamos julgados. Mas, quando somos julgados, somos repreendidos pelo Senhor, para não sermos condenados com o mundo.
Portanto, meus irmãos, quando vos ajuntais para comer, esperai uns pelos outros. Mas, se algum tiver fome, coma em casa, para que vos não ajunteis para condenação. Quanto às demais coisas, ordená-las-ei quando for ter convosco” (1 Co 11.17-34).

Elogios e Reprovações

0 propósito de Paulo quando deu instruções sobre a Ceia do Senhor à igreja de Corinto foi corrigir alguns abusos que estavam acontecendo durante a celebração. O contexto é bastante claro em dizer que havia individualismo, egoísmo e até mesmo quem se embriagasse durante a cerimônia. Os corintos não estavam discernindo o propósito da Ceia. Participavam como se estivessem participando de uma refeição qualquer.
O escritor Warren Wiersbe observa que ao participar da Ceia, o cristão deve olhar em quatro direções.9 Primeiramente ele deve olhar para trás. Esse olhar nos fará lembrar o motivo de sua morte — carregar os nossos pecados. Lembrar também que ele morreu de forma voluntária, demonstrando assim o seu amor por nós. Em segundo lugar, o crente deve olhar para frente. Ao olhar para frente ele lembrará do sacrifício do Senhor “até que ele venha”. Esse é um olhar escatológico, rumo ao futuro da igreja. Em terceiro lugar, o crente deve olhar ao seu redor. Esse olhar fará com que ele enxergue o outro e não seja um egoísta espiritual. De fato esse é o verdadeiro propósito da Ceia que é celebrar uma festa em família. Em quarto lugar, o cristão deve olhar para dentro. Esse olhar para dentro fará com que ele se examine a si mesmo. “Examine-se a si mesmo” (v.28).
Ao fazer esse olhar introspectivo o crente deve ter o cuidado para não se abster desnecessariamente da Ceia do Senhor. Muitos crentes deixam de participar da Ceia por motivos banais. Essa não é a atitude correta.
Na verdade o que tem levado muitos crentes a procederem dessa forma é a má interpretação que eles fazem das instruções dadas pelo apóstolo em
1 Coríntios 11.29: “Porque o que come e bebe indignamente come e bebe para sua própria condenação, não discernindo o corpo do Senhor”.

No livro de minha autoria Defendendo o Verdadeiro Evangelho, fiz uma exegese desse texto à luz do texto grego. Mostrei que a palavra grega anaksiôs, traduzida em português como “indignamente” é um advérbio e não um adjetivo. Como sabemos, os advérbios indicam “modo” ou “maneira”, enquanto os adjetivos indicam “estado” ou “qualidade”. Se Paulo em lugar do advérbio “indignamente” (anaksiôs) tivesse usado o adjetivo “indigno” (anaksiôs), então ninguém de fato poderia participar da Ceia do Senhor, pois ninguém é ou será digno.10 A salvação é pela graça e não por meio de nosso mérito ou dignidade. Da mesma forma, a participação da Ceia do Senhor por parte dos crentes é também uma manifestação da graça de Deus.
Voltando ao texto, o advérbio indignamente” (anaksiôs) mostra que Paulo estava se referindo ao modo irreverente dos coríntios ao celebrarem a Ceia do Senhor, isto é, enquanto alguns se embriagavam durante a reunião, outros comiam demais, além do fato de não esperarem uns pelos outros. Esta maneira de celebrar a Ceia do Senhor não estava correta, precisava da correção por parte do apóstolo.
Os escritores Guy P. Duffield e Nathaniel M. Van Cleave dizem isso com outras palavras:
Há necessidade de uma explicação sobre a advertência contra “comer ou beber indignamente” (1 Co 11.27-29). Muitos crentes, por não entenderem bem essas advertências, abstiveram-se desnecessariamente da Ceia do Senhor. Deve ser notado que “indignamente” é um advérbio que modifica os verbos “comer” e “beber”, e está ligado à “maneira” de participar, e não à indignidade das pessoas. A advertência referia-se à atitude ávida e descontrolada dos coríntios, descrita em 1 Coríntios
11.20-22. Ninguém é digno, por si mesmo, de ter comunhão com Jesus, mas possuímos esse privilégio em virtude da obra expiatória que os elementos simbolizam. Todavia, os participantes precisam examinar a si mesmos com relação ao modo como tomam a ceia e à sua atitude para com os outros crentes; além disso, devem verificar se estão discernindo
o corpo do Senhor, sem demonstrar irreverência ou frivolidade em suas maneiras. A participação com fé pode resultar em grandes bênçãos e até na cura espiritual e física (1 Co H.29,30).11

NOTAS

1 Enciclopédia Judaica, 10 volumes, Rio de Janeiro.

2 KOOGAN, A. Enciclopédia Judaica, 10 volumes, Rio de Janeiro.

3 A cerimônia que consiste em beber os Quatro Cálices para demonstrar alegria foi arbitrariamente introduzida pelos Sábios Rabínicos. Eles justificavam o número de cálices citando quatro verbos hebraicos que aparecem no Êxodo 6.6,7 em que é descrita a libertação dos israelitas do Cativeiro no Egito: “retirar”, “libertar”, “resgatar” e “tirar”. (Enciclopédia Judaica, vol. 6, pg.663).

4 Enciclopédia Judaica, op.cit. vol. 6, pp.656 a 665.

5 A palavra fermento vem do latim “fermentum” (fermento) e que traduz o termo grego “zimé”. Por outro lado, o hebraico possui os termos “hamets”, que significa “aquilo que é fermentado”; “homets”, que quer dizer vinagre, azedo; e “mahmetset”, que refere-se a qualquer coisa fermentada.

6 GRONINGEN, Gerad Van. Revelação Messiânica no Antigo Testamento - a origem divina do conceito messiânico e seu desdobramento progressivo. Editora Cultura Cristã, São Paulo.

7 GRONINGEN, Gerad Van. Revelação Messiânica no Antigo Testamento — a origem divina do conceito messiânico e seu desdobramento progressivo. São Paulo: Editora Cultura Cristã.

8 Os biblistas estão de acordo que foi durante a celebração da última Páscoa que Jesus instituiu o que a igreja cristã chamaria de Ceia do Senhor.

WIERSBE, Warren. Comentário Bíblico Expositivo — Novo Testamento, volume l. Rio de Janeiro: Editora Central Gospel.

10 No texto grego a diferença léxica entre esses termos é dada pelo alongamento da vogal omicron, por esse motivo que em nossa transliteração o primeiro termo traz um acento circunflexo, enquanto o segundo traz um acendo agudo.

11DUFFIELD, Guy P & CLEAVE, Nathaniel M.Van. Fundamentos da Teologia Pentecostal. Vol I e II. Editora Quadrangular, São Paulo, 1991.

Pastor : José Gonçalves


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