Igreja e política


Igreja e política
De uma maneira mais detida, debruçar-nos-emos na discussão sobre a existência ou não de uma afinidade entre a Igreja como corpo místico de Cristo e a Política, sendo esta vista como instância inerente a própria humanidade. De maneira secundária, mas não menos importante, dedicar-nos-emos na análise de alguns problemáticos aspectos da relação entre Igrejas Locais e os Políticos que atuam na ambiência histórico-cultural desta. Propomo-nos a defender a seguinte postura concernente a este delicado tema: a) A Igreja enquanto manifestação visível, mas indeterminável, do Reino de Deus na terra tem como tarefa atuar de maneira tão relevante que venha a transformar e influenciar positivamente a ação política, aspecto da humanidade marcadamente corrompido pelo pecado; b) As Igrejas Locais, comunidades sócio-historicamente constituídas, inevitavelmente manterão uma relação com o Estado - instância política de uma sociedade -; de tal modo que de uma maneira, direta ou indireta, esta se envolverá com a política institucionalizada, por isso cabe a Igreja Local a tarefa de contribuir para a formação de indivíduos integralmente redimidos, inclusive quanto às relações políticas destes, o que por fim redundará a construção de uma sociedade mais justa, ineliminável afã do Cristianismo.
                 A cada biênio, de uma maneira cíclica, a sociedade brasileira depara-se com uma onda de discussões sobre o papel da política na sociedade contemporânea. Como estamos em um ano de pleito eleitoral, novamente nos deparamos com debates a cerca da importância do voto consciente, da defesa da democracia como melhor modelo político para sociedades contemporâneas etc. Inseridas neste contexto estão as Igrejas Locais as quais vivenciam o mesmo burburinho em sua membresia. O questionamento que nos aflige é: qual deve ser o papel de uma Igreja Local no cenário de eleições político-partidárias? Para apresentar uma possível resposta a tal indagação é necessário realizarmos um recuo argumentativo e formular uma pergunta anterior, que seria: a Igreja do SENHOR Jesus tem alguma relação com a Política? É pela análise desta última, porém fundamental questão que iniciamos nossa reflexão.
                Em primeiro lugar é importante deixar bastante claro que a obra vicária do Senhor Jesus tem como objetivo atingir todos os aspectos da humanidade decaída. Assim sendo, a Política enquanto elemento constitutivo da humanidade tanto foi atingida pelos efeitos nefastos do pecado quanto será restaurada a seu estado originário quando da implantação do reino salvífico de Deus. Podemos definir Política como sendo a reflexão racional sobre a constituição das variadas esferas de poder existentes numa sociedade. Ora uma vez que o homem é um ser social a política torna-se um aspecto constituinte da própria humanidade. Partindo desta premissa já descartamos a possibilidade da Igreja, mesmo enquanto organismo espiritual, afastar-se absolutamente da política; tal postura é retrógrada e antibíblica, se o homem é um ser integral e a política é um dos âmbitos da humanidade, cabe a Igreja militar pela transformação deste homem, inclusive quanto a ação política.
                A Igreja, desta maneira, tem como tarefa ressignificar a politicidade, conduzindo esta ao centro da vontade de Deus para que as relações humanas possam ser desenvolvidas de uma maneira mais justa. Ainda que a implementação de uma sociedade sem desigualdades ou distorções sociais seja ao que acontecerá plenamente apenas num momento escatológico da humanidade, cabe-nos enquanto Igreja da contemporaneidade lutar por um mundo melhor para todos os indivíduos. Qualquer concepção contrária a esta viola o Evangelho que aponta a construção de um mundo mais equitativo. Deste modo podemos concluir que a Igreja do SENHOR Jesus tem como tarefa trabalhar pela restauração da natureza política dos seres humanos.
                A questão que nos resta agora analisar é sobre o papel de uma Igreja Local numa ambiência de política partidarizada. Iniciemos deixando bastante claro que não cabe a Igreja a doutrinação ideológico-partidária, muito menos o encabrestamento de votos por meio de ameaças espirituais ou emocionais. O líder de uma comunidade local, enquanto cidadão tem todo o direito de ter suas opções partidárias assim como preferências pessoais para efetivar suas responsabilidades/direitos políticos, todavia, enquanto ministro do Evangelho, no uso da palavra no púlpito, cabe ao Pastor contribuir para a politização de sua membresia, mas nunca para a partidarização desta. Se o Ministro deseja enveredar pelo caminho da militância político-partidária deve ter bem claro em sua mente que o espaço de construção das ideologias partidárias são as associações comunitárias, as reuniões de sindicatos ou de agremiações culturais - a Igreja não é nada disso. O local do culto deve ser destinado exclusivamente para a vivência da experiência do sagrado, não para servir de picadeiro político; o momento do culto é para louvor e adoração, e não horário político-eleitoral de doutrinação partidária.
                É lógico que o Pastor de uma Igreja Local deve falar e ensinar sobre política, contudo, nunca sobre um determinado político. A Igreja pode e deve ser um espaço de formação política, especialmente para os membros menos escolarizados, entretanto um líder nunca deve ensinar em quem votar, e sim como votar. Nunca deve falar dos defeitos ou qualidades de um determinado candidato, mas cabe-lhe esclarecer sua membresia sobre as qualidades, deveres e funções dos políticos de um modo geral. Será que nossos irmãos sabem qual a função de um vereador, de um prefeito ou ainda de um senador? Está, entre as tarefas mais urgentes de um líder local na contemporaneidade, a contribuição para a formação cidadã de sua membresia.
                A Igreja enquanto ajuntamento sobrenatural dos santos não necessita de candidatos, pois a luta desta não é contra carne ou sangue, contra instituições humanas ou terrenas; já os membros de uma determinada comunidade espiritual, constituída espaço-temporalmente, enquanto cidadãos necessitem de uma representação político-partidária para atingirem pleitos sociais, seus representantes, todavia, não serão escolhidos pelo cartão de membro que possuem, mas pelo histórico de luta social. Um bom Pastor/Pregador não será necessariamente um bom Político, são características absolutamente distintas as que qualificam estes grupos de indivíduos.
                Chama-me a atenção a postura de alguns indivíduos que compõe a Igreja Local, os quais são incapazes de evangelizar, entregar folhetos ou falar aguerridamente do amor de Jesus aos perdidos, contudo, quando o período de eleições político-partidárias inicia-se estes vão às ruas em carreatas, panfletam o nome e número de seus candidatos ou ainda são capazes de defender agressivamente suas opções eleitoreiras. Distribuição de "santinhos" em frente a Templos coordenada pela direção desta, que absurdo! Ameaças espirituais sobre aqueles que possuem ideologias político-partidárias divergentes das advogadas pela liderança da Igreja Local, que aberração! Onde estamos, na Idade Média ou no Brasil Colônia?
                Em tempos como os nossos, em que setores da política tem sido cada vez mais influenciados por uma ideologia contrária ao Cristianismo, cabe-nos, enquanto Igreja, formar bons indivíduos os quais a partir de suas vocações individuais atuarão em nossa sociedade levantando o estandarte do Evangelho em suas vidas. Não precisamos formar bons políticos, urge investir no discipulado e amadurecimento de bons cristãos. Não necessitamos fundar novos partidos políticos para representar os anseios da Igreja, talvez para alguns o que é necessário é refundar seu Cristianismo, ser luz onde quer que estejam, inclusive nos mais variados setores da política nacional.
                A chamada para uma reflexão mais profunda e amadurecida sobre política em nossas Igrejas Locais é imprescindível neste momento da história de nosso país. Usemos este contexto de efervescência democrática para afirmar nossas especificidades enquanto indivíduos, mas também para por em prática nosso Cristianismo que tem como elemento constitutivo o ajuntamento das diferenças, uma vez que em Cristo não há livre ou escravo, judeu ou gentio, direitista ou esquerdista, tucano ou comunista, em Cristo somos todos UM!
Fonte: http://adtemplocentral.com/conteudo/item/58-igreja-e-politica Acesso em 12 ago. 2012.
* * Membro da Igreja Evangélica Assembleia de Deus - Templo Central - Fortaleza/CE, doutorando em Filosofia pela UFC e diretor da SETADEC.
fonte portal ebd