Dança Litúrgica


Dança Litúrgica
Quero fazer uma ressalva importante. No final do texto o autor diz que "Igrejas presbiterianas estão dançando com requebros sensuais". Vou além meus irmãos, Não são somente os presbiterianos não!
Conheço Ass. de Deus em São Paulo que  ocorre isso também e não é só coreografia de certos "levitas", mas sim a igreja toda dança se requebrando.Que Deus nos livre e guarde mil vezes destas aberrações doutrinárias.
 
Kerux
Dança Litúrgica
Rev. Ludgero Bonilha Morais(*)
É nosso dever debater aqueles assuntos que versam sobre a vida de nossa
Igreja, quanto à sua doutrina, prática e liturgia. É fato sobejamente
experimentado em nossos dias, que há uma inclinação acentuada para a
novidade e ênfase na criatividade humana como expressão litúrgica e
teológica. Nosso tempo é de um exacerbado humanismo e subjetivismo e, aquilo
que nos parecia impossível acontecer anos atrás, hoje nosso espírito de boa
convivência já não luta, aceita e começamos a achar que tudo está bem.
Corremos sempre o risco de, tal como aconteceu com os coríntios, nos unir em
torno daquilo que deveria nos separar, e nos separar em torno do que deveria
nos unir.
Chamo a atenção dos irmãos, desta feita, para um tema em particular, qual
seja, a dança como expressão litúrgica. Muito comum em grupos carismáticos,
o uso deste recurso em seus cultos; dança de louvor, ou melhor, o requebro,
o meneio, o trejeito. Recorrem aos textos do Velho Testamento, onde
supostamente encontram suporte bíblico para esta prática.
Sem pretender esgotar este assunto, apresento as considerações que se
seguem. O vocábulo dança é uma das possíveis traduções da palavra grega
paizo e seus correlatos, bem como da palavra shireh da língua hebraica. São
elas comumente traduzidas por: agir como criança, brincar, dançar,
gesticular, zombar e imitar. É relacionada com o substantivo paidía ou
paidiá trazendo sempre a ideia de jogos eróticos.
Paizo tal como foi usada pelos gregos, muito comumente denota este verbo,
falta de seriedade com alguma coisa em termos de atitude ou conduta.
Significa também, saga levianamente tratada ou inventada, gesticular,
zombar, ridicularizar, lascívia, libertinagem, licenciosidade, tolice e
estupidez.
No contexto do Velho Testamento e da Septuaginta, a brincadeira encontra
expressão na natureza religiosa e cúltica dos jogos de danças no mundo
oriental primitivo e antigo. Os deuses eram venerados por meio de jogos e
danças. No culto do mundo ao redor do Velho Testamento e do Novo Testamento
encontramos muitos jogos e danças como meio de expressar a piedade.
Encontramos também no Velho Testamento danças por ocasião das celebrações de
vitória (Ex.15.20 e Jz.11.34). Duas razões juntas, para a manifestação pela
dança. A primeira, a demonstração da alegria pela vitória alcançada. A
Segunda, uma tremenda zombaria pelo inimigo derrotado. Dançar como expressão
de escárnio era algo que, de fato, ofendia os brios do inimigo. Quanto a
isso tem muito a dizer o Dr.W.O.E. Œsterday em seu elucidativo livro The
Sacred Dance (1923). Estas celebrações são encontradas especialmente nos
contextos de guerra, tal como, por exemplo, I Cr.13:8; 15.29 e II Sm.6.14.
De acordo com o articulista no dicionário teológico de Kithel, a
manifestação mais orgiástica foi a dança diante da arca, relatada em II
Sm.6.14-16, também num contexto de vitória de guerra.
Por ocasião da festas da colheita haviam manifestações de dança, como
registra Jz. 21.21. Estas manifestações eram sempre de uma dança
harmoniosamente desenvolvida por um grupo, a qual narrava uma história. Eram
manifestações legítimas do folclore. Há que se fazer uma distinção entre a
dança como expressão artística e o requebro sem arte, que tem como intenção
carnal, dar evidência às curvas do corpo e destaque às suas partes eróticas.
Nos Salmos cúlticos (26.6, 42.4, 149.3 e 150.4) aparece a palavra shireh.
Estes contextos nos fazem lembrar as procissões promovida pelo povo, rumo ao
templo. No tem- plo, o culto era o mais impeditivo possível. Os que entravam
no átrio eram somente os sacerdotes, dentre esses somente o sumo-sacerdote
adentrava ao santo dos santos. Do auditório não se ouvia nenhum som de
louvor. Os cantores, ministros do canto, entoavam os louvores (estes eram
também sacerdotes). Ao povo em geral não se lhe era dado o direito de pisar
o átrio. Os homens tinham o seu espaço, as mulheres outro mais atrás, os
gentios atrás do muro. (Jesus revela sua indignação no templo, pois, o lugar
dos gentios estava ocupado pelos vendedores. Jesus afirma, então, que aquela
casa será chamada casa de oração para todos os povos). Sendo assim, se o
povo não participava da cerimônia propriamente, encontraram eles uma maneira
de expressão, e esta foi no caminhar para o templo. Ajuntando a multidão,
engrossando a procissão, cantavam salmos. Os salmos cúlticos se reportam a
isso, e a palavra acima mencionada é assim traduzida andarei, passava eu com
a multidão do povo, com adufes e harpa, com adufes e danças. Somente o
Sl.150.4, em algumas versões, a palavra shireh e traduzida por dança.
Nas passagens escatológicas encontramos as seguintes traduções para a mesma
palavra: Jr.31.4, dança e 30.19, júbilo; Zc.8.5, brincarão.
Outras passagens são encontradas, a saber: I Rs.18.26; onde lemos a
referência ao manquejar dos profetas ao redor do altar de Baal. Em
Jz.16.25-27 que narra o infortúnio de Sansão, quando é trazido para o
palácio. Ali a palavra é traduzida por divertir, escárnio. Em Ex.32.6, o
povo de Israel, recém liberto do cativeiro egípcio, dança diante do bezerro
de ouro. Ilustrativas são as passagens de Gn.21.9 e 26.8. A primeira fala de
Ismael que caçoava (ridicularizava) de Isaque, o que provoca em Sarah uma
profunda indignação. A passagem seguinte ilustra o porque desta indignação,
pois em 26.8 esta palavra é traduzida por acariciava. É Isaque, agora
casado, acariciando Rebeca. O motivo da indignação, portanto, estava no fato
de Ismael ridicularizar Isaque com meneios, trejeitos, passando-lhe a mão,
dançando ao seu derredor. No livro do profeta Isaías este sentido vem ainda
mais à luz. No capitulo 3, verso 16 há uma descrição daquelas mulheres que
com disposição frívola andam a passos curtos (a mesma palavra é aqui usada).
Seus meneios e trejeitos, passos afetados, com intenção de minar a moral do
povo.

No Novo Testamento a palavra paízo ocorre somente em I Ct.10.7, fazendo
citação do Velho Testamento em Ex.32.6. É o repudiar de todo culto pagão.
Aqui está relacionado com a idolatria. O texto de Êxodo se refere a uma
dança cúltica. Como em Gn.26.8; 39.14-17, a palavra que ali aparece tem um
sentido erótico. Assim pode ela denotar, tanto idolatria como licenciosidade
cúltica: frequentemente com ela associada. Tertuliano em De Jejunio, fala
seis vezes do Lusus Impudidus, se referindo ao acontecimento narrado em
Ex.32.6, descrevendo aquela manifestação, portanto, como danças vergonhosas.
Para os crente de Corinto, também, a diversão das festas sacrificiais era
uma grande tentação à idolatria.
Se a palavra paizo é encontrada uma única vez, sua correlata empaizo é
encontrada mais vezes. Seus significados são: jogar, dançar ao redor,
caçoar, ridicularizar, iludir e defraudar. Esta palavra pertence ao grupo
das usadas para depreciação ou ridicularizar, levantar o nariz, balançar a
cabeça, bater as mãos como sinal de insulto ou escárnio e fazer
brincadeiras. Deriva de arrogância, mostrar superioridade, hostilidade e
aversão (Gn.19.14, Is.28.7 e seguintes).
O verbo empaizein ocorre somente nos evangelhos sinóticos. Sua primeira
ocorrência se dá em Mt.2.16, quando Herodes é enganado pelos sábios, que ao
invés de voltarem por Jerusalém, deixam-no a esperar. Em Lc.14.29,
encontramos a parábola do construtor imprudente que é ridicularizado por
seus circunstantes pelo fato de não poder levar a cabo o término da
construção.
Todas aos outras passagens se referem a Jesus Cristo. Na predição de sua
paixão a encontramos Mt.20.19, Mr.10.34 e Lc.18.32. Ali esta palavra é
sempre traduzida por escarnecer. Também na história de sua paixão, cumprindo
suas próprias predições (Mc. 15.16-20 e Mt.27.27-31). O ato dos soldados
colocando uma coroa de espinhos, um manto de púrpura, saudando-o,
golpeando-o com um caniço, cuspindo e curvando-se diante dele (constitui o
escárnio). O texto de Jo.19.1-3, usa esta palavra para descrever o incidente
como um todo. É o espetáculo. Mt.26.67-68, Mc.14.65 e Lc.22.63-65 tem sua
contra partida em Jr.51.18, pois os ídolos são objetos de escárnio obra
ridícula. Assim tratavam a Cristo, representando um macabro bailado ao seu
derredor. Este Jesus que arroga ser Deus, não é outra coisa nesta sanha
diabólica senão obra ridícula. É o inferno que se levanta contra o Ungido de
Deus. Cristo em sua agonia é a ridícula personagem da coreografia satânica.
Mas ali, quem de fato, estava sendo exposto ao vexame, era a antiga
serpente. Três dias depois o drama se conclui e os bailarinos do dragão
perdem o ritmo. A cabeça da serpente está esmagada.
Outros textos onde a palavra aparece são os seguintes: Hb.11.36 (escárnio) e
11.26 (prazeres transitórios); Jd.1.18 (escarnecedores - andando) e II
Pd.3.3 (escarnecedores... com escárnios... andando).
Concluímos, afirmando que, não há uma referência sequer que no culto do Novo
Testamento tenha havido manifestação da dança cúltica. Nem mesmo na Igreja
dos Pais Apostólicos, e nem ainda na Reforma Protestante do Século XVI.
Interessante! Por que não? pelo menos por quatro razões:
Primeiro, a dança era um costume pagão e procurou-se na Igreja Apostólica
evitar qualquer associação. O princípio da associação deveria ser levado em
conta. Não somente aquilo que era mal, mas também tudo aquilo que pudesse se
parecer com o mal. Se fizesse o povo lembrar dos cultos pagãos dos quais
muitos crentes eram egressos, evitar-se-ia!
Em segundo lugar, pelo fato, que foi deixado em relevo por Paulo aos
Coríntios. A dança tentava-lhes a idolatria, abria-lhes as portas à
licenciosidade e dava vazão ao erotismo. Nada de dança, a Igreja de Jesus é
uma comunidade de separados, chamados à pureza e à santidade!
Em terceiro lugar, porque o culto do Novo Testamento é adjetivado como
logikem latria (culto racional), ou melhor, supra-sensual. Não necessitamos
mais dos recursos visuais externos. Nosso culto é em espírito e em verdade.
A palavra usada por Jesus Cristo em sua conversa com a mulher samaritana é
significativa. Várias são as palavras que poderiam ser traduzidas pelo
vocábulo verdade na língua grega. A palavra, no entanto, usada por Jesus,
não se contrapõe a ideia de mentira. A palavra é contraposta, sim, a
símbolo, tipo, figura; recursos estes usados no culto do Velho Testamento.
Arrependimento era o por cinzas na cabeça, vergonha era simbolizada pelo
rasgar das vestes, submissão era o orar com o rosto em terra, a remissão dos
pecados se dava pelo derramar do sangue de animais etc. Nosso culto hoje não
necessita destas figuras, pois, é um culto supra sensual, a verdade
anteriormente apresentada por símbolos encontra sua expressão. Jesus! Quem
tem Cristo adora em espírito e em verdade.
Em quarto lugar, e mais importante que tudo mais, o culto no Novo Testamento
não permita a manifestação de dança sagrada pelo fato de que toda dança,
meneio de corpos, requebros, fazia lembrar o escárnio de Cristo. O
Dicionário Teológico do Novo Testamento de Kithel afirma: Seja o fato dos
soldados aqui estarem observando um costume (religioso), específico, ou
seguindo práticas do sacrifício persa, por exemplo, ou estarem simplesmente
expondo o suposto rei dos judeus ao ridículo, é muito difícil ter qualquer
certeza . Contudo, é certo de que este escárnio se dava num contexto de
dança e drama. Um show, um espetáculo, um ato público civil e religioso. A
dança cúltica fazia os crentes da Igreja Apostólica lembrarem-se da
horripilante coreografia desenhada a derredor do Salvador.
Hoje, vemos em algumas Igrejas Presbiterianas não propriamente a dança
artística, ainda assim condenável no culto. Pior que isso, vemos o requebro
sensual, expressão de carnalidade com ares de piedade. Sendo assim, irmãos,
creio eu, que devemos orientar os irmãos. Todos nós juntos não permitiremos
que o produto da criatividade de alguns crentes inadvertidos e outros mal
intencionados, vá tomando fôlego em nosso meio.

(*) Rev. Ludgero Bonilha Morais – Primeira Igreja Presbiteriana de Belo
Horizonte, MG