O Novo Código Eleitoral aprovado em segundo turno nesta quinta-feira na Câmara dos Deputados é um retrocesso que impacta diretamente em nossa democracia representativa, principalmente se for sancionado a tempo de entrar em vigor nas eleições do ano que vêm. Porém, isso só acontece se o Senado repetir o processo de tramitação acelerada adotada pela Câmara e analisar o Projeto de Lei Complementar (PLC) 112/21, que contem 898 artigos, em 20 dias.
O principal problema do PLC foi a falta de um debate aprofundado sobre um projeto desta amplitude que propõem mudanças estruturais no nosso sistema eleitoral. Os artigos abordam temas díspares como regras sobre partidos, inelegibilidades, propaganda eleitoral, financiamento de partidos e de candidaturas, e crimes eleitorais. Há pontos positivos, como a atualização da legislação em relação à lei de proteção de dados e ao marco regulatório da internet. Porém, a quantidade de retrocessos é maior do que os benefícios. A RAPS vem chamando atenção para esse problema. Mônica Sodré, diretora executiva da organização, falou do assunto em entrevistas recentes no Estúdio CBN e na Folha de São Paulo.
A versão levada ao plenário hoje é ainda pior do que a aprovada em agosto por um Grupo de Trabalho. Ao todo, o Novo Código Eleitoral foi analisado por apenas sete meses na Casa e teve somente sete audiências públicas – uma delas com quatro pessoas, em um período de 35 dias. O PLC, então, foi entregue à Mesa Diretora da Câmara no dia 03 de agosto. A título de comparação, o Código de Processo Civil levou cinco anos para ser aprovado.
Entre as alterações mais graves estão aquelas que tornam o processo eleitoral menos transparente e aumentando a possibilidade de fraudes. Por exemplo, os processos de prestação de contas de candidaturas preveem a volta dos documentos físicos em detrimento das versões digitais. Já a alteração no prazo para prestação de contas – o texto prevê 180 dias para aprovação – na prática inviabiliza a análise por parte da Justiça Eleitoral.
Para piorar, o PLC permite a contratação de empresas privadas, por parte dos partidos políticos, para realizar auditorias na próprias contas. Outra mudança significativa, mas que já fazia parte da versão anterior do texto, altera significantemente a quantidade de despesas que podem ser financiadas pelo Fundo Partidário. E a extinção da reserva financeira a ser gasta com campanhas de candidatas mulheres e de pessoas negras vai, na prática, dificultar a eleição delas.
Outro aspecto problemático da proposta de lei complementar trata das pesquisas com intenção de voto. O texto aprovado, ao proibir a divulgação delas na véspera e no dia da eleição, pode estimular a circulação de informações de fontes não confiáveis, com números falsos, que podem influenciar os eleitores. Outra decisão que vai facilitar a circulação de fake news foi a decisão de obrigar institutos tradicionais a informar o percentual de acerto das pesquisas divulgadas por eles nas últimas cinco eleições, o que reforça a narrativa de desconfiança com relação aos dados científicos.
Além desses pontos, pelo menos dois outros são igualmente polêmicos: a alteração da data inicial de contagem do período de inelegibilidade dos políticos condenados pela Lei da Ficha Limpa – o prazo continua sendo de 8 anos, mas começará a contar a partir da condenação e não mais após o cumprimento da pena. O texto original também previa uma quarentena de cinco anos para que juízes, integrantes do Ministério Público, militares das Forças Armadas e policiais pudesse disputar eleições, mas esse artigo foi derrubado em uma votação como destaque. Mais alguns artigos serão votados como destaque na semana que vem.
Enfim, o projeto atua em tantas frentes e altera tantos aspectos das nossas regras eleitorais que é impossível apreciá-lo, com a seriedade que o tema demanda, em apenas 20 dias. Se o Senado repetir a tramitação a toque de caixa adotada pela Câmara dos Deputados e o projeto for sancionado até o dia 02 de outubro, perde o eleitor, perde a democracia, perde o Brasil.
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